RIO – A rede de pizzarias Domino’s e a Walmart do Brasil trocaram de mãos nas últimas duas semanas. Em comum entre os dois negócios, o comprador: fundos de private equity, formados com dinheiro de outros fundos daqui e estrangeiros. É cada vez mais comum esse tipo de negócio no Brasil, seguindo tendência mundial. Eles já administram marcas de café, redes de fast-food e de supermercados, academia de ginástica, escolas e hospitais.

O foco são empresas promissoras, mas que ainda não entraram na Bolsa. O objetivo é acelerar o crescimento das empresas e depois vendê-las com lucro, para remunerar seus investidores, que são fundos de aposentados de universidades, fundos soberanos de países e até fortunas familiares. Foram R$ 154,3 bilhões de capital destinados a este modelo de investimento no país em 2017, de acordo com a Associação Brasileira de Private Equity e Venture Capital, que engloba tanto as empresas que compram fatias de outras companhias, como as que apostam em start-ups ou empreendimentos com mais risco. Os estrangeiros responderam por 58% deste segmento.

No controle da Burger King, da Unidas Rent a Car, da universidade à distância Uniasselvi e da Cecrisa, de cerâmica, estão os mesmos donos. O comando está ou já passou pelas mãos da gestora Vinci Partners II, num fundo que soma R$ 2 bilhões. Eles acabaram de comprar a Domino’s.

— Sempre compramos o controle da empresa. Temos metas de produtividade, eficiência, custo de produção, crescimento e margem — afirma Alessandro Horta, presidente da Vinci Partners, que movimenta R$ 6 bilhões em todos os seus fundos.

A necessidade de controle vem do tipo de investimento, afirma Horta. Como é de longo prazo, de cinco a seis anos, o investidor não pode ter acesso ao recurso antes de um prazo determinado:

— Ao abrir mão da liquidez, temos que influenciar na gestão.

O ex-presidente do Banco Central Arminio Fraga, sócio da Gávea Investimentos, está na gestão de empresas como Multiterminais, Energisa, Paschoalotto (de serviços financeiros), Grupo São Francisco (de saúde) e Natural One (de sucos). A Gávea é minoritária, participando do conselho e indicando o diretor financeiro:

— São empresas que querem crescer e precisam de ajuda na estratégia e na parte financeira. Não existe receita única. Procuramos ser um bom sócio, atuante, que participa das discussões.

EM 2017, 93 TRANSAÇÕES

Arminio afirma que as críticas de que os fundos só querem lucro e não se preocupam com o futuro da empresa a longo prazo, pois vão sair dela em algum momento, procedem em parte:

— Nunca investimos com a cabeça de dar uma guaribada para vender. Essa crítica procede quando o fundo alavanca excessivamente a empresa, sacrificando resultados de longo prazo pelos de curto prazo. Isso vai contra nossa forma de atuar.

Desde 2006, a Gávea investiu R$ 6 bilhões em cinco fundos, injetando recursos em 50 empresas, das quais 11 foram listadas em Bolsa e o restante teve um retorno superior ao do Ibovespa. Segundo Arminio, cerca de 10% das apostas deram errado.

A indústria de sucos Natural One, do empresário Ricardo Ermírio de Moraes, ganhou injeção de recursos da Gávea, que comprou 49,9% do negócio criado há 12 anos. Segundo Alexandre Salles, diretor financeiro, o investimento acelera a expansão do negócio e atrai talentos:

— A Gávea alocou um sócio para ficar ligado nas operações, nas relações gerenciais, na forma de administrar, na governança e no processo decisório. Há executivos de empresas mais maduras da carteira da Gávea que trocam experiências conosco.

E não houve redução do quadro de empregados. Em 2016, ano da entrada da Gávea, eram 240 funcionários. Atualmente, são 300. Mas houve demissões.

— Mantivemos a maior parte do quadro — conta Salles.

Segundo a Transactional Track Record, houve no ano passado 93 transações de compra de participações em empresas, somando R$ 20,6 bilhões, 65% a mais do que em 2016. Uma das recentes foi a compra da Walmart no Brasil pelo fundo Advent.

A Leste, gestora fundada pelo ex-sócio do BTG Pactual Emmanuel Hermann, comprou em fevereiro 40% da Fábrica de Bolo Vó Alzira. O fundo venceu a resistência da família, que já havia refutado duas ofertas. Três argumentos foram usados: os investidores seriam minoritários, a gestão ficaria com a família e não haveria prazo de saída do fundo.

— Há a percepção de que esse pessoal se acha o dono da verdade. Mas a Leste tem nos deixado fazer o que fazemos de melhor, enquanto ajudam nas áreas financeira e de governança. Quando entra outro sócio, você se mexe — contou Alexandre Martins, diretor executivo da empresa e filho da dona Alzira.

O fundo ajudou a convencer a família a desistir de expandir as operações para a Flórida e, em vez disso, focar em São Paulo, onde quer ter 50 lojas até o fim do ano. Aos 70 anos, Dona Alzira trabalha na gestão da qualidade das 220 lojas. O plano é fechar 2018 com 370. A Bolo Vó Alzira se encaixa na filosofia da Leste de privilegiar negócios familiares. Segundo Bernardo Rodenburg, chefe de private equity, são companhias comprometidas:

— O potencial de conflito é maior com o fundo sendo minoritário, mas tentamos entender a visão do fundador. Eles entendem do negócio mais do que qualquer fundo.

O fundo americano HIG tem R$ 1 bilhão investido na América Latina e mais R$ 2 bilhões para aplicar na região. No Brasil, investiu na Mr. Cat. Globalmente, administra US$ 25 bilhões.

— Somos um caso único de fundo grande que só gosta de empresas médias. Quanto aos setores, somos agnósticos — disse Fernando Oliveira, diretor para América Latina.

Fonte: TTR