Foto: Para Carolyn Taylor, crises podem ser uma oportunidade, sejam elas impulsionadas por fatores internos ou externos

Na crise econômica as empresas brasileiras se acostumaram a um novo normal – fazer mais com menos, pressão constante por resultados, equipes mais enxutas. Para a consultora Carolyn
Taylor, referência em cultura organizacional, mesmo com a retomada da economia os efeitos do período serão sentidos por muito mais tempo, e caberá aos gestores definirem se a crise terá deixado um legado ou uma maldição para as companhias.

Cultura corporativa é, na visão de Carolyn, um termo que define o comportamento diário e a maneira de fazer as coisas dentro de uma empresa.
“Você constrói sua cultura pela forma como você opera todos os dias. A sua resposta a uma crise é um exemplo da cultura”, diz a consultora inglesa, autora do livro “Walking the Talk”, escrito em 2005 e lançado no Brasil em 2014 pela Publit. O título também dá nome a sua consultoria, fundada há 25 anos e presente no Brasil há mais de uma década. Carolyn conversou com o Valor na semana passada, durante uma passagem pelo país.

Para ela, momentos de crise, sejam elas prolongadas e impulsionadas por fatores externos como uma recessão econômica ou geradas por aspectos internos, como escândalos de corrupção ou acidentes ambientais, devem ser usadas como momentos de oportunidade. A chave para fazer isso é assumir a responsabilidade e erguer um espelho para a organização, identificando as atitudes que levaram à crise ou que foram tomadas em resposta a ela. “Algumas culturas vão culpar o ambiente externo e outras vão se perguntar como podem se tornar mais espertas e aprender com o que aconteceu”, afirma.

Exemplos como as empresas denunciadas por corrupção na Operação LavaJato ou o banco Wells Fargo, onde foi revelado que milhares de funcionários abriram contas em nomes de clientes sem autorização, demonstram que dificilmente a empresa pode se eximir de responsabilidade e colocar irregularidades na conta de algumas “laranjas podres”. “Não consigo pensar em nenhum caso em que encontrei um ou dois indivíduos que cometeram fraudes mas não havia uma cultura maior que contribuiu para isso”, diz.

Na sua experiência, é quase sempre possível identificar onde estão as vulnerabilidades que podem levar a irregularidades e fraudes durante a análise da cultura de uma empresa. “Pode ser por causa de uma cultura de falta de controle, ou de pressão exacerbada por resultados sem o questionamento de como eles serão obtidos”, diz. Especialmente em períodos de crise, em que essa pressão chega por todos os lados, ela defende que as empresas se perguntem sempre onde estão as aberturas que permitiriam aos funcionários encontrarem “atalhos” para melhorar o desempenho.

“É irresponsável colocar pressão em uma organização sem fazer essas perguntas, e é nesse ponto que executivos seniores contribuem para uma cultura que causa problemas”, afirma. As vozes que exigem mais desempenho e as que reforçam valores e ética devem ser propagadas com o mesmo volume, diz Carolyn. “Na maioria das organizações, a voz da ética e dos valores não é forte o suficiente”, afirma.

Na falta de uma liderança atenta, crises costumam elevar o medo entre os funcionários, o que traz o pior das pessoas. “Há duas maneiras de liderar durante uma crise, uma é com uma visão e a outra é por meio do medo”, diz. Ter uma visão exige ser muito específico e transparente sobre as necessidades da empresa e qual o papel dos funcionários dentro da estratégia – além, é claro, de tomar as decisões de cortes e demissões com “dignidade”. “Para exigir mais das pessoas, é preciso ser capaz de transmitir um senso maior de propósito, e ter muito cuidado para que as exigências aconteçam apenas no curto prazo, pois as pessoas não vão ficar depois se elas sentirem que estão sendo abusadas”, diz.

Na sua experiência, cerca de metade das empresas são capazes de fazer essa auto-avaliação e sair de crises mais fortes do que entraram. No Brasil, Carolyn percebe uma facilidade maior das pessoas aceitarem mudanças e serem menos apegadas ao passado, na comparação com a Europa, mas ela também enxerga uma grande limitação na dificuldade do brasileiro de ter conversas difíceis e falar abertamente sobre problemas – algo essencial para a cultura corporativa evoluir.

Outro ponto que ela destaca como uma vantagem na economia brasileira é a prevalência de empresas familiares que, na sua opinião, são mais comprometidas com o longo prazo. “A cultura corporativa é um empreendimento de médio prazo, você não vai ver um resultado em alguns meses”, diz. Para a consultora, é preciso esperar de dois a três anos para realmente perceber o impacto que uma crise pode ter na cultura organizacional de uma empresa.

Carolyn é otimista, no entanto, e enxerga uma conscientização crescente no mundo corporativo de que é possível e necessário analisar e trabalhar a cultura dentro das empresas. Na sua visão, isso é consequência das muitas crises que quase destruíram companhias, da chegada de uma nova geração de executivos e executivas ao poder, mais confortável com a gestão de assuntos antes considerados “leves” demais, e da necessidade sentida pelas empresas de se tornarem mais ágeis e adaptáveis a um mundo acelerado e incerto.

A agilidade é hoje a característica mais buscada por executivos que a procuram para fazer diagnósticos e mudanças de cultura em suas empresas. Dar mais poder e autonomia aos funcionários vem em seguida, como requisito para permitir mais rapidez nas organizações. “É uma grande mudança em termos de confiar, delegar e aprender a resolver problemas horizontalmente, sem escalar tudo para os gestores, o que toma mais tempo”, diz. Para complementar esses aspectos, ela recomenda dois outros pontos importantes na cultura: curiosidade para aprender constantemente e a humildade de saber que nem sempre se tem todas as respostas.

Fonte: Valor Econômico | Por Letícia Arcoverde