Plataformas de financiamento coletivo oferecem a possibilidade de o investidor se tornar sócio de uma startup. O ganho pode ser alto, assim como o risco

O brasileiro Mike Krieger precisou mudar para os Estados Unidos, em 2004, e batalhar por uma vaga na Universidade de Standford, na Califórnia, para se tornar um empreendedor de sucesso. Foi lá que ele conheceu o seu sócio americano, Kevin Systrom. Em 2010, eles fundaram o Instagram. Dois anos depois, a rede social foi vendida para o Facebook, em negócio de US$ 1 bilhão, que transformou os amigos em milionários. Mas não é preciso morar e estudar fora para ter a chance de ser sócio de uma empresa bilionária. Hoje é possível fazer parte do capital de uma startup com apenas alguns cliques em plataformas de financiamento coletivo (crowdfunding). A modalidade ainda é nova no País, mas já atrai investidores que buscam diversificar o portfólio em meio à queda na taxa de juros. Eles esperam ser recompensados, no longo prazo, com um retorno que, em algumas vezes, pode chegar até a 30 vezes o
valor investido.

Esse potencial de ganho foi o que motivou o empresário paulista Ranieri Torsinelli a investir R$ 50 mil na Horus, empresa embrionária que utiliza drones para monitorar áreas rurais. E não foi a sua primeira aposta. Torsinelli já havia aportado cerca de R$ 200 mil, cerca de 5% do seu portfólio, para se tornar sócio de quatro startups. “A ideia é multiplicar o investimento e, quem sabe, ganhar alguns milhões”, diz. Ele é um dos 700 clientes da Eqseed, plataforma que opera desde 2015 e, em 19 rodadas de investimento, já captou R$ 12,5 milhões.


Horus: empresa de monitoramento agrícola levantou R$ 2 milhões em uma única rodada de investimento

Uma dos motivos de sucesso é a simplicidade do processo. O interessado se inscreve em uma das oito plataformas registradas na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e tem acesso ao portfólio de empresas que buscam recursos. Quando confirmado o aporte, ele se torna, oficialmente, credor da empresa e recebe um título conversível em ações. Há três maneiras de conseguir lucro com a operação. A primeira delas é a empresa ser vendida para alguma grande companhia, como aconteceu com o Instagram. A segunda, em um processo de abertura de capital ou por meio do pagamento de dividendos mediante lucro. “É um investimento de alto risco e, por isso, limitamos os aportes a 10% do patrimônio do investidor”, diz Greg Kelly, fundador da EqSeed.

Para as empresas que estão nas vitrines das plataformas, o montante arrecadado é essencial para o crescimento do negócio. No caso da Horus, foram levantados R$ 2 milhões na sua rodada na Eqseed. “Vamos usar esse dinheiro para desenvolver novas tecnologias, como a avaliação de pragas específicas nas lavouras”, diz Fábricio Hertz, fundador da companhia, que atende 500 clientes em todo o País. Já a cervejaria 3 Cariocas, que também captou R$ 2 milhões na plataforma, pretende abrir a sua própria fábrica. “Hoje usamos a estrutura de terceiros, o que dificulta o ganho de escala da operação”, diz o fundador da cervejaria João Gabriel Reis. Apesar do potencial de retorno, não há garantias de lucro aos investidores. “A nossa ideia é aumentar o negócio e fazer a empresa crescer, e os sócios serão recompensados com isso em algum momento”, afirma Reis.

Mesmo em meio ao risco elevado, que já o índice de mortalidade das startups no primeiro ano chega a 75% no Brasil, pelos cálculos da Fundação Dom Cabral (FDC), a modalidade tem seduzido cada vez mais adeptos. O momento é propício. Diante do baixo patamar da taxa básica de juros – 6,5% ao ano –, os investidores estão ávidos por diversificação e maior rentabilidade. Os números comprovam esse movimento: em 2018, 24% das 400 mil pessoas que acessam o comparadores de investimentos Yubb, se mostram interessadas em opções em crowdfunding. O site tem convênio com cinco plataformas. “A forte demanda reflete uma opção inovadora de investimento, que permite rentabilidade alta a partir de aportes de R$ 1 mil”, diz Bernardo Pascowitch, fundador da Yubb.


Greg Kelly: fundador da plataforma EqSeed acredita que o segmento pode movimentar R$ 1,6 bilhão por ano no Brasil

Outra frente contemplada pelas plataformas é o investimento imobiliário, uma das modalidades mais tradicionais do País. Esse é o negócio da Urbe.me, que opera desde 2015 e já arrecadou R$ 23 milhões em 16 rodadas. Com 22 mil clientes cadastrados, sendo 3 mil ativos, tem tíquete médio dos aportes de R$ 4 mil. Aqui, diferentemente das startups, o investidor não se torna sócio. Ele adquire uma participação no Valor Geral de Vendas (VGB) de empreendimentos na planta, o que significa uma rentabilidade de 14% ao ano, em média. “O mínimo é 120% do CDI”, diz Alexandre Oliveira, gerente de marketing da Urbe.me.

Embora ainda não tenha um número oficial para mensurar o desempenho do segmento do País, Greg Kelly, da EqSeed, acredita que o mercado deve se aproximar, nos próximos anos, do desempenho observado no Reino Unido. Por lá, as duas maiores plataformas de crowdfunding movimentaram o equivalente a R$ 1,6 bilhão em 2017. Para ele, a regulamentação da CVM, publicada em agosto do ano passado, facilita as transações e tende a incentivar o crescimento do segmento. “Isso foi essencial para promover dinâmica ao negócio. Antes, precisávamos de autorização para possibilitar cada rodada”, diz.

Fonte: ISTOÉ Dinheiro