Foto: Cassio Beldi (à esq.), sócio da Mint; José Aliperti, sócio fundador da Escola Mais; e Guilherme Affonso Ferreira Filho, presidente da Bahema Educação
Entre 2013 e 2017, o número de alunos em escolas públicas de educação básica caiu 8%, enquanto o volume de matrículas na rede privada cresceu 7%. Essa tendência deve continuar com força diante da perspectiva de recuperação da economia – a expectativa é que 1 milhão de estudantes dos ensinos infantil ao médio migrem para colégios particulares nos próximos cinco anos, de acordo com a consultoria EY Parthenon. Diante desse cenário, grupos educacionais e investidores estão de olho no mercado de escolas para a classe C.
Neste ano, o Grupo SEB, do empresário Chaim Zaher, anunciou um investimento de R$ 50 milhões na criação da rede Luminova, de escolas com mensalidade de até R$ 560. Agora, um outro grupo de investidores e empreendedores planeja aportar pelo menos R$ 25 milhões na ampliação do projeto da Escola Mais, com mensalidades de R$ 690 e aulas em período integral. A primeira unidade começou a funcionar este ano no bairro da Penha, na zona Leste de São Paulo.
A Escola Mais tem como investidores a Bahema Educação, holding da família Affonso Ferreira (conhecida por investimentos no antigo Unibanco e na empresa de autopeças Mahle Metal Leve); a gestora de recursos Mint; e a Ágathos Educacional, rede de colégios das bandeiras Anglo e Objetivo, que tem entre os sócios Luiz Castanho, pai de Daniel Castanho, presidente do conselho da Anima – um dos maiores grupos de ensino superior privado do país.
Juntos, Bahema, Mint e Ágathos detêm uma participação de 60% na Escola Mais. A outra fatia pertence aos fundadores do empreendimento: o administrador de empresas José Aliperti, o engenheiro e cineasta Günther Mittermayer e a pedagoga Marina Castellani.
Tanto a Escola Mais quanto a Luminova entraram nesse mercado com a proposta de oferecer colégios de baixo custo, boa qualidade e metodologias modernas de aprendizagem. Há aulas de inglês todos os dias, aprendizado adaptativo com uso de plataforma tecnológica, trabalhos em equipe para desenvolvimento de habilidades sócio-emocionais, entre outras ferramentas adotadas em colégios voltados para o público de alta renda.
Nos dois casos, os acionistas têm experiência com colégios premium. O SEB é dono do colégio Concept, conhecido por metodologias pedagógicas inovadoras, que tem mensalidade na casa dos R$ 8 mil. A Bahema é acionista da Escola da Vila, em São Paulo, uma das pioneiras na adoção do construtivismo – metodologia que propõe que o saber não seja passado pronto pelo professor, mas construído pelo aluno, por meio da exposição de situações, formulações de hipóteses e atividades interativas. As mensalidades da Escola da Vila na educação básica vão de R$ 2,6 mil a R$ 3,3 mil.
Na visão de Felipe Miglioli, sócio da EY Parthenon, há uma oportunidade de mercado no segmento de escolas para a classe C, uma vez que os alunos podem vir tanto da rede pública num momento de melhora da economia, quanto de outras escolas particulares mais caras num cenário de crise. “Na cidade de São Paulo, há 5 mil escolas privadas, sendo que 15% têm mensalidades abaixo de R$ 500. Muitas vezes, a qualidade de ensino dessas escolas é muito parecida com a da rede pública”, diz Miglioli.
“Escolhemos abrir nossa primeira unidade na Penha porque é a região com o pior desempenho no Enem [Exame Nacional do Ensino Médio] entre as escolas particulares da zona Leste da capital”, afirma Aliperti, que antes dessa empreitada trabalhou no Colégio Porto Seguro e numa startup de educação. O investimento inicial foi de R$ 5 milhões para desenvolvimento de material didático e reforma do prédio que, atualmente, abriga 60 alunos do sexto e sétimo ano.
A inadimplência dessa primeira turma da Escola Mais é de menos de 1%, mesmo patamar das escolas premium da Bahema, que além da Escola da Vila, também é acionista da Escola Parque, no Rio, e da Balão Vermelho, em Belo Horizonte. “Quando os pais têm a percepção da qualidade do ensino eles são mais comprometidos, independentemente da renda”, diz Guilherme Affonso Ferreira Filho, presidente-executivo da Bahema.
Mas ao contrário dos colégios voltados para a alta renda, cujas margens são elevadas, as escolas com um perfil mais popular requerem uma outra forma de operar. “É um tipo de negócio que precisa ter escala para a conta fechar”, afirma Cássio Beldi, sócio fundador da Mint. Não à toa, a Escola Mais pretende levantar R$ 20 milhões com investidores no próximo ano para abrir outras duas unidades em 2020, também na zona Leste de São Paulo. A meta é chegar em 2022 com cerca de 13 unidades na capital paulista.
Antes de investir no segmento premium, a Bahema analisou o mercado de colégios da base da pirâmide, mas desistiu devido ao desafio da escala. O projeto da Escola Mais foi apresentado em 2015 e a Bahema decidiu entrar como investidora minoritária, com uma fatia de 15%, dando total liberdade aos fundadores.
“Nosso foco principal continua sendo as demais escolas, mas sabemos que há um limite de crescimento no público de alta renda. Ao mesmo tempo, temos consciência dos grandes desafios do mercado ‘low cost’ de escolas”, disse Affonso Filho. Um desses desafios é o gap de conhecimento que o aluno da rede pública chega na escola privada. A Escola Mais atende alunos dos ensinos fundamental II e médio.
No longo prazo, os sócios da Escola Mais vislubram a possibilidade de o governo firmar parcerias com escolas privadas para atender alunos de baixa renda. O futuro ministro da Economia Paulo Guedes é um defensor da oferta de “vouchers” pelo governo para que estudantes tenham acesso à rede privada. “Hoje, o governo gasta R$ 700 por aluno na educação básica no Brasil. Em São Paulo, o valor sobe para R$ 1,2 mil. É mais do que as nossas mensalidades e a qualidade do ensino é ruim”, diz Aliperti.
Hoje 80% dos alunos da educação básica estão na rede pública – um indicativo do potencial desse segmento para o setor privado, apesar da tendência de queda nas matrículas no ensino fundamental como um todo. O movimento, detectado pelo Censo Escolar da Educação Básica 2017, é relacionado principalmente à mudança no perfil demográfico da população.
Fonte: Valor Econômico